quarta-feira, 30 de julho de 2008

O Povo Eleito


Foi em junho de 1976 que a editora de "Planeta" no Brasil publicou uma obra que, a princípio, parecia distoar de sua linha editorial.

A obra era "O Povo Eleito", editada originalmente na Inglaterra, em 1971, sob o título "The Chose People". Seu autor: John Allegro, um pesquisador inglês, com formação em arqueologia e antropologia, poliglota inclusive em idiomas antigos, cuja reconhecidas competência e dedicação, sobretudo nos estudos ligados à então chamada "Arqueologia Bíblica", o fizeram ser indicado como um dos representantes britânicos na Força-Tarefa internacional criada para decifrar os Manuscritos do Mar Morto.

Foi no decurso daquele trabalho que Allegro começou a perder sua respeitabilidade acadêmica, tanto devido a algumas atitudes polêmicas, que alguns consideraram pouco éticas mas, principalmente, por ter sofrido uma espécie de transformação radical em seus conceitos religiosos e históricos.

De cristão convicto, ligado a instituições religiosas inglesas, Allegro passou a proclamar que o Cristianismo era uma grande farsa, que Jesus não passara um rebelde zelota aspirante ao trono judeu, e que toda a Bíblia fora escrita num código secreto, que escondia o uso e o culto de uma substância alucigenógena (a "Amanita Muscária"), obtida a partir de um cogumelo de formato fálico.

O resultado dessa descoberta foi o lançamento do livro "The Sacred Mushroom and the Cross", onde ele afirma que Yahweh era uma divindade filologicamente referida ao Zeus indo-europeu, cujo nome comum, de origem sumeriana, significa "spermatozoa" - a seiva sagrada da vida criada.

À semelhante conclusão chegara e semelhante reação tivera um respeitável esoterista francês, Robert Ambelain, ligado à tradição martinista, que após igual surto de desencanto cristão, escreveu várias obras sobre Jesus, Paulo de Tarso e outros personagens bíblicos, todas absolutamente heterodoxas, e que chegaram a causar um certo furor nos círculos intelectuais europeus.

"O Povo Eleito" de Allegro é Flávio Josefo reescrito, e seu autor compartilha a mesma postura ideológica reacionária do historiador judeu, criticando asperamente a conduta dos Zelotas e de todos os que lutavam contra o status quo vigente na Judéia do século I. Para Allegro, como para Josefo, os zelotas não passavam de bandidos.

Mas ler esse livro de Allegro é bem melhor do que ler Josefo. Seu estilo é muito mais agradável e, se desprezarmos certas afirmações alucinadas do escritor e seu mal disfarçado anti-semitismo, é possivel revisitar o mundo judeu daquele tempo, como se estivéssemos assistindo a um filme.
(Alvaro Rodrigues - Redação original: 2006 - Versão atual: 2008)

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